Os cascalhos abriam caminho para a carruagem que conduzia Ludwig van Beethoven. O contínuo balanço remexia suas lembranças. Uma vida marcada por sofrimentos, sonhos frustrados, isolamento e dor. A carregada fisionomia já não exibia os inconformismos da mocidade; havia se transformado num amargor resignado.
Por três décadas convivia com o progressivo mal que o impedia cada vez mais ouvir. Quisera o Destino que um paradoxo possuísse sua alma, outorgando à sua genialidade uma tarefa que a outrem não seria alcançada. Dar ao mundo imagens escritas em ritmos, melodias, harmonias como nunca havia existido. Já doze anos se passavam no completo silêncio.
- Todos experimentarão, sem dar-se conta, as poderosas notas ressonando nas delgadas cordas dos sentimentos. Os imperceptíveis dedos sinfônicos exalarão os sons da existência.
O carro atingia lentamente seu alvo. O imponente Kärntnertortheater reverenciava o mestre transbordando indivíduos que se espremiam aguardando sua chegada. Todos mais uma vez apreensivos para saber o que, desta vez, lhes reservava os sons da surdez.
- Absortos não compreenderão sua própria e exultante alegria que irromperá nos últimos compassos.
O cocheiro range o freio dando fim ao agitado trajeto. Pescoços estendidos saúdam o compositor procurando degraus de melhor visão. A curiosidade ignóbil, força motriz das massas, mobiliza a platéia para mais um banquete imerecido. Em instantes ocuparão seus poleiros grasnando futilidades de suas míseras vidas. Iletrados na sublime escola, desconhecem os ensinos que a natureza outorga aos que desejam ouvi-la. Aproveitadores ingratos das benesses da vida, não entendem a importância do dom que lhes foi concedido. Parasitas andantes, consomem seus preciosos tempos ao nada, impelidos por sua vontade inconsciente de voltar ao pré-início.
Um tipo pomposo cumprimenta entusiasticamente o mestre, e num arroubo medonho de insensibilidade começa a falar ignorando a severa expressão.
Por três décadas convivia com o progressivo mal que o impedia cada vez mais ouvir. Quisera o Destino que um paradoxo possuísse sua alma, outorgando à sua genialidade uma tarefa que a outrem não seria alcançada. Dar ao mundo imagens escritas em ritmos, melodias, harmonias como nunca havia existido. Já doze anos se passavam no completo silêncio.
- Todos experimentarão, sem dar-se conta, as poderosas notas ressonando nas delgadas cordas dos sentimentos. Os imperceptíveis dedos sinfônicos exalarão os sons da existência.
O carro atingia lentamente seu alvo. O imponente Kärntnertortheater reverenciava o mestre transbordando indivíduos que se espremiam aguardando sua chegada. Todos mais uma vez apreensivos para saber o que, desta vez, lhes reservava os sons da surdez.
- Absortos não compreenderão sua própria e exultante alegria que irromperá nos últimos compassos.
O cocheiro range o freio dando fim ao agitado trajeto. Pescoços estendidos saúdam o compositor procurando degraus de melhor visão. A curiosidade ignóbil, força motriz das massas, mobiliza a platéia para mais um banquete imerecido. Em instantes ocuparão seus poleiros grasnando futilidades de suas míseras vidas. Iletrados na sublime escola, desconhecem os ensinos que a natureza outorga aos que desejam ouvi-la. Aproveitadores ingratos das benesses da vida, não entendem a importância do dom que lhes foi concedido. Parasitas andantes, consomem seus preciosos tempos ao nada, impelidos por sua vontade inconsciente de voltar ao pré-início.
Um tipo pomposo cumprimenta entusiasticamente o mestre, e num arroubo medonho de insensibilidade começa a falar ignorando a severa expressão.
- O infeliz se consola quando encontra uma desgraça igual à sua.
Os músicos estão em sua absorta parafernália timpânica ajustando com rigor suas armas. Sequer notam o maior táctico até então conhecido cumprimentar em gestos tímidos a platéia que o saúda.
- Tendes-me como rancoroso, insociável e misantropo.
Seu lugar está reservado ao lado do maestro, que em seu nervosismo orgulhoso, deglute ares tensos. Lado a lado irão desfrutar as primeiras fragrâncias da orquestra, condutor e escultor. Aquele em pé com sua baqueta desenhará no imaginário as primeiras palavras de cada instrumento. O sentado se esforçará em ouvir de sua cadeira as vibrações de cada nota.
- Não há palavras que poderia vos descrever a asfixia ressecada destes ouvidos inválidos.
Chegada a hora, os arautos tomam seus lugares empunhando afinadamente seus aparelhos. A horda finalmente se torna completamente quieta. O presente tornar-se-á poesia versada no passado. Os últimos suspiros serão gritados ao mundo.
* Texto adaptado de um roteiro para história em quadrinhos.